Burrinho Pampa

EU NASCI NUM CAMPO ABERTO BEM DISTANTE DA CIDADE, E VIVI OS PRIMEIROS ANOS DA MINHA VIDA COM PAPAI E MAMÃE EM COMPLETA FELICIDADE, O MEU PAI ME LEVAVA COM ELE EM TODOS OS CANTOS, E MAMÃE COM O SEU MANTO ME COBRIA TODAS AS NOITES ANTES DE SE DEITAR. QUANDO O DIA ÃMANHECIA , EU JÁ CORRIA LÁ PRO TERREIRO BRINCAR, E MEU PAI JÁ LOGO VINHA PARA ME COLOCAR NA GARUPA DE SEU CAVALO E SAÍA COMIGO PRA GALOPAR, COLOCAVA O SEU CHAPÉU NA MINHA NUCA, E EU IA GRITANDO UPA UPA, FAZENDO AOUELA ARRUACA, E MAMÃE ACHAVA GRAÇA VENDO DE LONGE A GENTE BRINCAR. UM CERTO DIA NUM DOMINGO DE MANHÃ, ERA O MEU SEXTO ANIVERSÁRIO E EU NEM SÁBIA, FOI QUANDO EU VI O MEU PAI CHEGANDO DA CIDADE PUXANDO UM BURRINHO PAMPA, ACHEI ATÉ QUE NÃO ERA VERDADE, MAS QUANDO ELE CHEGOU ME DEU UM BEIJO E ME ABRAÇOU, E ME COLOCOU EM CIMA DAQUELE BURRINHO, QUE PRA MIM ERA O MAIS LINDO QUE EXISTIA NO MUNDO, E DESSE JEITO FALOU: MEU FILHO VOCÊ SABE QUE SEU PAI NÃO TEM DINHEIRO, MAIS NUNCA NADA LHE FALTOU, EU JÁ SOFRI MUITO NA VIDA E POUCA COISA PRA MIM RESTOU, MAIS EU TENHO UM ORGULHO TÃO PROFUNDO; QUE É DOIS TESOURO QUE DEUS NÃO ME NEGOU. UM É Ã SUA MÃE QUE EU AMO TANTO E OUTRO É VOCÊ, QUE É A MAIOR ALEGRIA QUE EU TENHO NESSE MUNDO. E DE HOJE EM DIANTE, VOCÊ NÃO PRECISA MAIS DA MINHA GARUPA, PRA BRINCAR DE UPA UPA, VOCÊ JÁ MERECEU, VOCÊ É UM MENINO ESPERTO E EU TENHO CERTEZA QUE AQUI POR PERTO, NINGUÉM TEM UM BURRINHO TÃO BONITO QUE NEM O SEU. FOI TANTA A MINHA EUFORIA, QUE EU PULAVA DE ALEGRIA, EU BEIJEI TANTO MEU PAI NAQUELE DIA, QUE ELE ATÉ SE COMOVEU. EU IA ATÉ LÁ NA ESTRADA, GALOPAVA E VOLTAVA, IA LÁ NA ROÇA, GALOPAVA NAS PAIOÇA, E TODO MUNDO QUE EU VIA, EU JÁ CORRIA PRA MOSTRAR O BURRINHO QUE O MEU PAI ME DEU. QUANDO MEU PAI IA PRA CIDADE, COM O MEU BURRINHO EU ACOMPANHAVA, FOI A MELHOR FASE DA MINHA VIDA, NA VOLTA PRA CASA A GENTE SEMPRE APOSTAVA CORRIDA, E ELE SEMPRE DEIXAVA EU GANHAR. PROS MEUS AMIGUINHOS EU SEMPRE FALAVA DO ORGULHO QUE EU SENTIA, E QUE PAI MELHOR QUE O MEU NO MUNDO NÃO EXISTIA. TODOS OS DIAS EU IA COM O MEU
BURRINHO NA ESCOLA, E A TARDE EU VOLTAVA CORRENDO, COM
OS MEUS CADERNOS AMARRADOS NA GARUPA, E VINHA GALOPANDO ALEGRE E CONTENTE, VENDO O MEU PAI LA NA PORTEIRA, ME ESPERANDO PRA ME ABRAÇAR. ERA TANTA FELICIDADE QUE EU SENTIA, QUE ATÉ PARECIA QUE AQUILO TUDO ERA UM SONHO QUE EU VIVIA, E QUE NUNCA IRIA SE ACABAR. MAS ESSE FOI O MEU MAIOR ENGANO, PORQUE QUANDO CHEGOU NO FINAL DO ANO, NO ULTIMO DIA DE AULA, QUE EU VINHA VOLTANDO DA ESCOLA, CORTANDO O MEU BURRINHO NA ESPORA, NAQUELA PRESSA DE CHEGAR, DE LONGE EU VI A PORTEIRA, MAIS MEU PAI NÃO TAVA LÁ. QUANDO EU FUI CHEGANDO, JÁ VI UM MONTE DE GENTE CHORANDO, E JÁ FORAM ME SERURANDO, DIZENDO QUE EU NÃO PODIA ENTRAR. TODOS ME OLHANDO COM PENA, ENQUANTO EU OUVIA ALGUÉM FALANDO QUE AQUILO NÃO ERA SENA QUE UMA CRIANÇA
PUDESSE OLHAR. MAS EU NÃO ENTENDIA, O QUE, QUE AQUELA GENTE TODA ALI FAZIA, E PORQUE QUE ELES NÃO ME DEIXAVAM ENTRAR. FOI QUANDO EU VI Á MINHA MÃE, QUE VEIO ATÉ A PORTA, E SE AJOELHOU NA MINHA FRENTE, E ME ABRAÇOU, E ME APERTOU TÃO FORTE, ELA CHORAVA TANTO QUE O SEU PRANTO GELAVA NAS MINHAS COSTAS. E OLHANDO A NOSSA VOLTA, EU VIA UM SILÊNCIO EM CADA ROSTO. E MINHA MÃE NAQUELE DISGOSTO, OLHOU BEM DENTRO DOS MEUS OLHOS, QUE NESSA HORA JÁ NÃO TINHA MAIS AQUELE BRILHO DE ALEGRIA, PORQUE EU SENTIA QUE A NOTÍCIA NÃO ERA BOA, MAS ELA NÃO ME DIZIA, PORQUE AS PALAVRAS NÃO SAIA .. DE SUA BOCA. MAS OLHANDO NOS OLHOS DELA EU VIA, UMA INFINITA LUZ DE TRISTEZA QUE ME FEZ OLHAR PARA AQUELE MONTE DE VELAS ACESAS LÁ NO MEIO DA SALA, E IMAGINAR, QUE AQUELA COISA ESTRANHA FEITA DE MADEIRA, É QUE ERA A RAZÃO DE TODA AQUELA TRISTEZA, E QUE ERA O MEU PAI QUE TAVA LÁ. MEU PAI ESTAVA MORTO. MAIS EU NÃO QUERIA ACREDITAR. PEGUEI MEU BURRINHO PAMPA, DESCAMBEI NAS INVERNADAS, E MEU PAI FUI PROCURAR. E NAQUELA MINHA INOCÊNCIA DE CRIANÇA. POR TODOS OS CANTOS EU PROCURAVA, EU CORRIA E GRITAVA:
PAPAI...PAPAI.., ONDE O SENHOR ESTÁ, CHEGA DE TRABALHAR, JÁ TÁ FICANDO TARDE, VAMOS PRÁ CASA QUE EU AINDA TENHO TANTO PRÁ LHE FALAR. E EU TENHO UMA NOTÍCIA TÃO BOA PRÁ TI DAR; O SENHOR JÁ DEVE TÁ ATÉ COMEMORANDO; PAPAI EU PASSEI DE ANO, E EU QUERIA TANTO LHE ABRAÇAR. MAS AGORA EU TÔ COM MEDO, EU ESTOU CHORANDO PAPAI, E PORQUE QUE O SENHOR NÃO APARECE NESSA HORA PRÁ ME AJUDAR, O SENHOR SEMPRE FOI O MEU HERÓI. SEMPRE DIZIA PRÁ MAMÃE. QUE O SENHOR NUNCA SE AFASTARIA DE NÓS, E HOJE O SENHOR NÃO ME ESPEROU LÁ NA PORTEIRA, E EU JÁ TI PROCUREI A TARDE INTEIRA, E AINDA NÃO CONSEGUI TE ENCONTRAR. TÁ ESCURECENDO PAPAI, E EU TENHO MEDO DE VOLTAR PRÁ CASA SOZINHO, TEM UM MONTE DE GENTE ESTRANHA LÁ. POR FAVOR PAPAI. VEM COMIGO, O SENHOR QUERIA TANTO QUE EU PASSASSE DE ANO, VAI LÁ E DIZ PRÁQUELÁ GENTE TODA, QUE AQUILO TUDO É UM ENGANO, E QUE O SENHOR SÓ SE DEMOROU, PORQUE A GENTE TA VÁ BRINCANDO, DE APOSTAR CORRIDA, E QUE PELA PRIMEIRA VEZ NA SUA VIDA; O SENHOR TINHA CONSEGUIDO GANHAR.
QUE TRISTEZA TÃO GRANDE, MEU VELHO PAI. O SENHOR. ME CAUSOU AQUELE DIA, E EU QUE TI XINGUEI TANTO, QUANDO EU NÃO TI VI LÁ NA PORTEIRA, NAQUELE DIA ME ESPERANDO PRÁ ME ABRAÇAR. MÁS AGORA EU TENHO A VIDA INTEIRA PRÁ TI PEDIR DESCULPAS, E PELAS TANTAS VEZES QUE EU INSISTIA PRO SENHOR ME LEVAR NA GARUPA, E O SENHOR NÃO PODIA PORQUE TRAVA TRABALHANDO, E EU FICAVA ALI INSISTINDO, TI PERTUBANDO, ATÉ QUE O SENHOR SE COMOVIA, E NUM GESTO DE PACIÊNCIA, ME COLOCAVA NA SUA GARUPA, E EU TI ABRAÇAVA. E o SENHOR. ATÉ DAVA RISADA. DE VÊ A MINHA
ALEGRIA, E DAQUELA FULIA TODA QUE EU APRONTAVA. MAS UMA COISA MEU VELHO, QUE POR MUITOS ANOS EU NÃO TE PERDUAVA, É QUE EM TODAS AS NOSSAS CORRIDAS, O SENHOR SEMPRE DEIXAVA EU GANHAR. MAS AQUELA QUE SERIA Á MAIS IMPORTANTE DA MINHA VIDA; O SENHOR ME DEIXOU PRÁ TRAZ , E ATÉ HOJE EU AINDA NÃO CONSEGUI TE ENCONTRAR.
EU ERA TÃO FELIZ MEU PAI. EU SEI QUE FOI O DESTINO QUEM QUIS QUE AQUELE SONHO UM DIA SC ACABASSE, EU ESPEREI TANTO QUE O SENHOR VOLTASSE, PRÁ ME FAZER DE NOVO FELIZ. MAS AGORA EU JÁ TENHO 16 ANOS DE IDADE, E MINHACORRIDA AGORA. E CONTRA A DOR E A SAUDADE. PORQUE EU SEI QUE NA REALIDADE; HOJE EU ESTOU SOZINHO NAS MÃOS DE
DEUS. O SENHOR SABE; A MAMÃE TAMBÉM JÁ MORREU, E EU SINTO TANTA FALTA DOS SEUS CARINHOS.
SABE MEU PAI. EU SEI QUE É DIFÍCIL A GENTE VIVER NO MUNDO SOZINHO, MAS EU AINDA TENHO O MEU BURRINHO, AQUELE MESMO QUE O SENHOR UM DIA ME DEU. AGORA ELE TÁ GRANDE, FICOU BONITO, CRESCEU. E HOJE EU SEI QUE ELE SOFRE TANTO QUANTO EU7 PORQUE ELE SABE A FALTA QUE O SENHOR ME FAZ. E DE VEZ EM QUANDO MEU PAI, EU SAIO COM ELE GALOPANDO PELA ESTRADA, E ÁS VEZES EU PASSO PARA TRAZ DO ARREIO, E VOU SENTADO NA GARUPA, E FICO OLHANDO PRÓ ARREIO VAZIO NA MINHA FRENTE, IMAGINANDO O SENHOR ALI SENTADO, E EU ABRAÇADO NA SUA CINTURA. PARECE QUE EU SINTO ATÉ O CHEIRO DAS SUAS COSTA, DA SUA CAM ISA SUADA, DO SOL QUENTE E DO MORMAÇO, E DE REPENTE EU OLHO PRÓS MEUS BRAÇOS, E SINTO AQUELE VAZIO, O CORAÇÃO QUASE PARANDO, ENQUANTO O BURRO VAI CALANDO SEUS PASSOS, E EU FICO ALI PARADO, ENGOLINDO A LÁGRIMAS E OS SOLUÇOS QUE NA GARGANTA VEM APERTANDO.
TRISTE SINA DO MEU PASSADO, QUE VIVE ME MACHUCANDO. E A VIDA QUE TUDO ENSINA, JÁ ME ENSINOU UM DITADO QUE PRÁ MIM É O MAIS PROFUNDO;
AMAR OS PAIS ENQUANTO ELES TEM VIDA, PORQUE DEPOIS DE ENTERRADOS NÃO TEM REMEDIO NESSE MUNDO QUE PODE CURAR ESSA FERIDA.

Autor: Beto Pereira