terça-feira, 24 de julho de 2007

Filho Ingrato

Certa vez estive viajando por esse Brasil a fora,
Quando me vi no sertão
Numa estrada de chão... Era tarde umas três horas!

De repente meu carro quebrado, fechei os vidros,
Deixei ali encostado
E ajuda foi procurar
Quando eu vi uma casa ali perto, o lugar era deserto;
Pelo trilho comecei a andar.

Fui chegando devagarinho e quando estava pertinho
Por ajuda fui gritando
A casa parecia abandonada
A porta não estava trancada, eu abri e fui entrando.

Na entrada logo vi que alguém morava ali
Pois tinha uma cama velha, duas panelas na prateleira
Num canto um banco encostado
O fogão de lenha do lado e a moringa era a geladeira!

De repente ouvi um gemido
Entrei e vi um velho caído que me disse com a voz estremecida:
"Meu filho, sente aqui do meu lado
Só ouça,fique calado, a historia da minha vida:

Eu era um rapaz faceiro era o rei dos boiadeiros
Tinha vida pra dar e vender,
Na viola era um açoite
Trabalhava dia e noite, só não sabia escrever!

Me apaixonei por uma moça chamada Teresa
E no dia do nosso casamento dançamos até noite adentro
E eu fazia os meus planos
Vou construir nossa casinha, criar gado, criar galinha
Nem que demorasse muitos anos.

Mas aí veio a tristeza
A minha querida Tereza o filho não pode suportar
Foi sentindo a dor do parto
Que ai nesse mesmo quarto ela partiu
E com Deus foi morar!

Fiquei eu e o menino
Tracei ali seu destino e jurei a ele estudar
Nem que eu tivesse sacrifício, se fosse pro seu benefício
Até sangue eu ia derramar!
Mas quem tem Deus não se apura
Mesmo levando uma vida dura não podia me queixar
Eu era muito valente, o menino era inteligente.
Arroz e feijão nunca iriam faltar.

Me lembro como se fosse agora
Ele chegando da escola no último dia do ano
E com sua simplicidade me disse:
Pai eu quero entrar na faculdade pois é esse o meu plano.

E se foi para cidade grande
Me deixando aqui tão longe pra vencer no seu futuro
Eu fazia economia, trabalhava noite e dia
Pra manter o seu estudo.

Se passaram quatro anos
E eu na roça lutando numa vida muito dura
Mas ao céu eu agradeci pela graça que recebi
Pois chegou o dia da sua formatura.

Vesti meu terno de estopa, eu não tinha outra roupa
No pé meu velho sapatão, com as unhas sujas de terra
Pulei vales cruzei serras,
Pra ver meu filho receber sua formação.

Fui chegando na cidade e com minha simplicidade
No salão eu fui entrando.
Quando vi meu filho do lado
Tava bonito, tava arrumado e pro seu lado fui andando.

Eu fui com os braços abertos
Mas na hora ele saiu de perto com uma cara risonha
Criticou minha roupa velha, as unhas sujas de terra
Falou que de mim estava com vergonha!

Foi embora e me deixou ali num canto
Dos meus olhos escorreu o pranto e no peito uma grande dor,
Pois ali me desprezava, quem eu tanto ajudava
Do fundo do meu amor!

Fui saindo do salão, cruzei aquela multidão
Com o peito cheio de tormento
Então voltei pra esta casinha, pra tocar minha vidinha
E esquecer meu sofrimento.

Hoje estou velho eu sei, de tanto que trabalhei
Da minha dor, que mais parece uma ferida,
O meu filho não vi nunca mais,
Hoje deve ser doutor, o senhor dos tais
E eu aqui no fim da minha vida.

Mas vá, parte agora,
E se um dia encontrar meu filho por essa estrada a fora
Diga a ele que aquele terno de estopa
Que usei no dia de sua formatura
É o mesmo terno que usei no dia que me casei
Com aquela que morreu pra lhe dar a vida
E é com ele que vou ra sepultura.

Diga também que foi com aquele velho sapatão
Que eu trabalhei e tirei desse chão
O sustento do seu futuro
E as unhas sujas de terra,
Representam o anel de formatura de quem nunca teve estudo.

E por fim, diga a ele que lhe perdôo,
Que por Deus eu lhe abençôo,
Não reclamo a minha cruz
Foi tão grande meu sofrimento
Mas não se compara em nenhum momento
Ao sofrimento de Jesus!

Autor: Alan Coelho

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